A Virgindade e a Sexualidade: da Liberação para a Ditadura Sexual

Se olharmos o que era a mulher no início do século passado e a compararmos com a de hoje, veremos que houve uma brutal transformação.

De totalmente passiva, sem direito sequer a votar, tendo como maior projeto de vida casar e viver totalmente devota para o casamento, sem outro tipo de aspiração, encontramos nesse início de século, uma pessoa totalmente diferente, extremamente participativa em todos os segmentos da sociedade e que já não coloca como seu maior projeto o casamento, mas conquistas profissionais, satisfação pessoal, realizações.

No entanto, apesar de todas essas mudanças, a maior se insere no desenvolvimento da sua sexualidade. Então, quer dizer que a mulher de hoje é totalmente liberada sexualmente? Não necessariamente.

Como tudo na vida, toda transformação é regida por ciclos. Da repressão sexual quase que total que prevaleceu durante séculos, houve um período, lá pelo período pós-segunda guerra mundial, que a mulher se liberou totalmente dessas amarras, discutiu e provou a experiência do amor livre e descompromissado até passar por um período pós-Aids em que toda essa liberalidade experimentou uma inquietação e, desde então, essa questão vem sendo discutida de uma maneira mais ponderada, a despeito de a mídia ainda insuflar muita essa questão da mulher objeto.

Em meio a todo esse repensar que vem vindo desde a eclosão da Aids lá pelos anos 1980, e prosseguindo nessa virada de século, a mulher vem reavaliando muita coisa e, nesse contexto, entra a questão da virgindade. Mas aí surgem muitas dúvidas: até que ponto a virgindade é importante para uma mulher? Será que ela não sofre preconceitos em meio a um mundo em que o sexo ficou banalizado?

Recentemente, foi feito um levantamento bem abrangente sobre a vida sexual dos brasileiros, patrocinados pelos laboratórios Pfizer e coordenado pela psiquiatra Carmita Abdo, do Projeto Sexualidade do Hospital das Clínicas, de São Paulo, em que se pode colher uma informação importante sobre esse assunto. Verificou-se, nesse estudo, que muitas garotas ainda consideram a perda da virgindade uma decisão essencial para seu desenvolvimento pessoal e social.

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A Virgindade e a Sexualidade

Para obter essa “libertação”, elas não fazem questão de que seu primeiro parceiro sexual seja aquele que no futuro poderá se tornar seu marido. Nessa busca desenfreada pela libertação do fardo da virgindade, muitas tomam essa decisão, e aí é que está o xis da questão, não por razões de natureza interior, mas simplesmente para serem bem aceitas pelo grupo do qual fazem parte, ou seja, o negócio é evitar ser ridicularizada pelos demais.

Movidas por essa preocupação com “o que os outros vão dizer” que muitas se entregam ao primeiro que aparece, afinal, querendo ou não, uma mulher depois de uma certa idade que vive sozinha, ainda carrega um estigma. Segundo a pesquisa, constata-se um dado muito preocupante: a liberdade sexual pela qual diversas gerações de mulheres lutaram tanto está se transformando em obrigatoriedade sexual.

Sexo Banalizado

A antropóloga Mirian Goldenberg, em entrevista concedida à Revista Istoé, confirma que essa “obrigatoriedade sexual” prevalece entre as adolescentes de hoje. Para ela, a virgindade ainda é estigmatizada, tanto que ela é somente valorizada pelas famílias conservadoras, mas entre a maior parte da juventude, é motivo de chacota.

Isso faz com que muitas tenham vergonha de assumir sua virgindade. Para ela, na realidade, as meninas atualmente vivem um dilema. Se elas tem muitos parceiros, são tachadas de galinhas, se bancam as difíceis, são desconsideradas pelo grupo. Enfim, como exigir da adolescência que tenha bom senso?

O ponto principal, portanto, e que é preocupante, é que a sexualidade da mulher, nesse aspecto, a despeito de ela conviver em um mundo em que ela conquistou muito espaço, é muito mal resolvida. E o grande problema disso é que a maioria das mulheres segue um padrão culturalmente estipulado pela mídia, de pessoa feliz, e quem não segue esse modelo, acaba se sentindo retrógrado e infeliz.

Nesse contexto, em nome da modernidade, acabam adotando certos padrões de comportamento que não estão de acordo com suas convicções, mas de acordo com que a mídia impõe. Nessa confusão que se estabelece, muitas mulheres se sentem na obrigação de atingir o orgasmo, por exemplo. Outras passam a encarar a relação sexual como se fosse uma disputa em que o mais feliz será aquele que for mais permissivo, libidinoso e descontraído.

A Virgindade Também Ocupando Espaço na Mídia

Em meio a toda essa confusão, certamente os homens também não estão imunes a esse comportamento. No caso dos homens, o que se “vende” é a imagem do “pegador”, que também age dessa forma, muitas vezes, para provar para os outros que ele é o melhor, que tem em seu “currículo” uma lista infindável de mulheres que provaram do seu vigor sexual, mas também, por mais paradoxal que pareça, uma nova onda que a mídia vem divulgando e cujo modelo maior é o jogador de futebol, Kaká, que resolveu assumir certa vez que era virgem até se casar.

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A Virgindade Também Ocupando Espaço na Mídia

Isso na realidade vai na onda do crescimento do movimento evangélico jovem no mundo e que, sorrateiramente, vai impondo uma nova moral de comportamento, que na realidade não é tão nova assim: a de que a virgindade somente deve ser perdida após o casamento, o que também não deixa de ser um padrão e não uma decisão consciente, ou seja, devo seguir o que a minha religião determina e não porque, simplesmente, desejo ser virgem porque assim me sinto integro.

Reflexões

O fato é que estamos vivendo uma fase um tanto estranha. A aparente liberdade sexual se tornou uma ditadura do sexo, em que as pessoas não estão preocupadas em ser felizes, porque ser feliz implica em assumir certos riscos: a de, às vezes, contrariar a maioria, em nome de algo muito maior, que é a satisfação consigo mesmo.

Que adianta eu querer agradar os outros para ser aceito pelo grupo, se aquilo não me satisfaz? Será que vale a pena eu me iniciar sexualmente mais cedo que a geração dos meus pais, se estou preocupado em usar o sexo simplesmente como instrumento para que os outros gostem de mim? Por autoafirmação? Por outro lado, será que vale a pena eu ser virgem porque minha religião diz que esse é o caminho certo?

Por que meus pais querem que eu seja? Vai ver que até por isso, existem tantas separações entre casais, porque nada é feito com muito consciência.

Nessa caminho, vamos apenas mudando de padrões de comportamento, sem nos importamos muito conosco mesmos. Talvez se mudássemos esse enfoque, veríamos que o sexo, ao contrário do que os moralistas de plantão pensam, não é problema, muito pelo contrário, o que atrapalha é o autoboicote, esse é sem dúvida, a maior promiscuidade.

Estamos sempre nos boicotando para sermos aceitos pelos outros e isso é que é problemático, pois gera relacionamentos superficiais e, assim, poucos crescemos internamente. De qualquer forma, nada impede que façamos essa virada em nossas vidas, a não ser nós mesmos. Quem está disposto a pagar esse preço?

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Categoria(s) do artigo:
Qualidade de Vida

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