Gastrite Crônica Atrófica

O termo gastrite muitas vezes é utilizado como sinônimo de alguns sintomas inespecíficos relacionados à porção superior do sistema digestório, mais especificamente com relação ao esôfago ou ao estômago. Atualmente esse termo está incluso no que é chamado de dispepsia funcional ou de dispepsia não ulcerosa, que é uma alteração no epitélio que reveste o estômago, caracterizada por hiperemia, que é o aspecto avermelhado, e que é geralmente causado por um processo inflamatório que, por sua vez, pode acometer a mucosa gástrica de modo agudo ou crônico. No entanto, em algumas pessoas, pode ser que haja de fato uma inflamação, mas que ela não seja muito expressa ou aparente no exame de endoscopia.

Atualmente é utilizada uma classificação das gastrites chamada de Sistema Sydney, que enfatiza a diferença entre a gastrite atrófica da não atrófica. Mas para que essa classificação possa ser realizada, são necessárias 5 biópsias, sendo uma da grande e outra da pequena curvatura do estômago, uma uma da incisura angular, uma a cerca de 4 centímetros do angulus e outra a aproximadamente 8 centímetros da cárdia. Esse sistema faz a classificação de acordo com a topografia, morfologia e etiologia da doença.

A atrofia da mucosa gástrica geralmente é o resultado de um longo período de processo inflamatório, o que faz com que ela esteja presente geralmente nas gastrites do tipo crônica. A bactéria Helicobacter pylori (H. pylori) é o agente etiológico responsável por mais de noventa e cinco por cento de todos os casos de gastrite crônica em todo o mundo. Isso porque essa bactéria não apresenta muitos competidores na mucosa gástrica, o que favorece sua adaptação e, portanto, sua colonização. Essa infecção é raramente eliminada de maneira espontânea, algumas crianças ainda são capazes disso, mas em geral essa infecção gera uma resposta imunológica não só local, mas também sistêmica, causando dentre outras coisas, uma gastrite a nível histológico de variados graus de intensidade.

A primeira região do estômago a ser acometida é o antro, mas a infecção pode também ser mais predominante no corpo ou então em todo o estômago, que é a chamada pangastrite. Quando ocorre no antro, a secreção gástrica não sofre muitas alterações de redução ou ela pode inclusive chegar a sofrer um aumento, embora cause um maior risco de ocorrência de úlceras da porção duodenal do intestino. Já quando o corpo do estômago é acometido, a mucosa oxíntica sofre degradação, o que provoca uma intensa redução da produção de ácido, o que auxilia ainda mais na destruição da mucosa e favorecendo inclusive a ocorrência de metaplasias, elevando de três a quatro vezes a chance de desenvolvimento de carcinoma gástrico. E quando o antro é acometido, geralmente não há sintomas, embora esse quadro esteja mais relacionado a casos de dispepsia funcional.

A história da metaplasia se inicia com a infecção pelo H. pylori, que desenvolve uma gastrite crônica, em seguida, as glândulas gástricas se atrofiam e, por fim, se dá início à metaplasia. A infecção por essa bactéria também pode trazer outras consequências como a úlcera péptica, que também está muito relacionada ao câncer de estômago, cujo principal é o adenocarcinoma tipo intestinal. A metaplasia consiste na formação de um epitélio do tipo intestinal só que no estômago, o que faz com que esse epitélio chamado de metaplásico apresente células de linhagens diferentes próprias da mucosa do intestino como, por exemplo, células endócrinas, células caliciformes, enterócitos e células de Paneth.

Sendo assim, quando há uma atrofia da mucosa do estômago, abre a possibilidade da existência de metaplasia, o que faz ser necessária uma investigação mais aprofundada. Na realidade é isso o que torna importante o acompanhamento da gastrite crônica. Outro fator importante é o tratamento do H. pylori, pois a erradicação dessa bactéria auxilia na remissão da gastrite quando em sua forma ativa e isso acaba reduzindo a ocorrência de doença ulcerosa, além de a gastrite crônica se reverter ao normal quando esse microrganismo é erradicado. No entanto, há controvérsias sobre isso, uma vez que alguns estágios de metaplasia e de atrofia já sugerem condições pré-neoplásicas e, nesses casos a erradicação da bactéria apenas impeçam a progressão dessas lesões e da metaplasia.

Outro tipo de atrofia da mucosa estomacal é a causada pela gastrite crônica autoimune, que também é chamada de gastrite do tipo A. ela acomete as porções do fundo e do corpo do estômago e raramente atinge a porção antral. Essa atrofia pode ser parcial, seletiva ou completa e, nesse caso, há a substituição das células normais da mucosa por células com características intestinais, assim como na metaplasia causada por H. pylori. Essa alteração causa a chamada hipocloridria ou acloridria, dependendo do grau de atrofia, que é a redução ou a ausência da produção de ácido clorídrico. Além disso, devido ao fato de haver uma redução do fator intrínseco, a absorção da vitamina B12 fica prejudicada, o que promove o desenvolvimento de anemia perniciosa. O caráter autoimune vem do fato de os pacientes que apresentam esse quadro terem positividade nos testes imunológicos, além de esses pacientes também apresentarem outras doenças autoimunes, como tireoidites, por exemplo. Por trás disso há uma teoria genética, que indica a presença de um gene autossômico único o responsável pelo desenvolvimento da doença. No que se refere ao funcionamento gastrointestinal, esse tipo de gastrite costuma ser assintomática e o que indica a doença é a presença da anemia perniciosa. A única conduta para os pacientes com esse tipo de gastrite, uma vez que ela é assintomática, é a reposição de vitamina B12 por toda a vida. No entanto, esses pacientes devem ser acompanhados porque eles apresentam uma chance de três a cinco vezes maior de desenvolverem carcinoma gástrico, o que faz necessária a realização de endoscopias periódicas, com biópsias, caso necessário, de diferentes regiões do estômago.

Já as chamadas gastrites químicas envolvem as gastrites reativas, de refluxo ou chamadas tipo C, que incluem as gastrites em que há alteração devido ao refluxo biliar, ao uso contínuo de certas drogas ou então as idiopáticas, em que não há um motivo muito claro para sua ocorrência.

Outras doenças infecciosas que não o pela H. pylori também estão relacionadas a gastrites crônicas que causam atrofia da mucosa gástrica, como a tuberculose, a sífilis secundária tardia e terciária, além da infecção por citomegalovírus. O importante de ser lembrado dessas doenças é a avaliação integral do paciente, uma vez que na maioria dos quadros iniciais os sintomas gástricos sugestivos de atrofia da mucosa do estômago em decorrência de gastrite geralmente são assintomáticos e o tratamento precoce evita a evolução e o possível desenvolvimento de uma metaplasia.

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Categoria(s) do artigo:
Doenças

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