As anemias Megaloblásticas têm esse nome justamente porque apresentam megaloblastos, isto é, células precursoras dos eritrócitos em um tamanho maior que o normal. Isso faz com que a pessoa apresente eritrócitos chamados macrolíticos, que são anormalmente grandes.
Há duas causas principais para que essa produção de eritrócitos grandes ocorra: a deficiência de folato ou a de vitamina B12. Tanto uma quanto outra causa promove efeitos idênticos, que não se limitam à produção de eritrócitos macrolíticos, mas também a uma síntese de DNA dessa célula de forma incorreta. O que vai diferir são as causas e algumas consequências dessa deficiência de vitamina B12 ou de folato.
Mas não são apenas os precursores de eritrócitos que são grandes. Os precursores de granulócitos também estão aumentados nessa doença. Além disso, a produção de um DNA defeituoso, como citado anteriormente, promove uma divisão celular defeituosa também, bem como uma maturação do núcleo celular de maneira errônea. E é justamente isso o que causa a chamada assincronia nuclear citoplasmática, pois enquanto há esse problema com o DNA e, por consequência, com a maturação do núcleo, a síntese do RNA, por sua vez, e de todos os outros componentes do citoplasma se encontram dentro da normalidade, o que culmina com a produção de um citoplasma muito grande para aquele núcleo imaturo e defeituoso.
Uma pessoa cuja medula óssea produz células desse tipo desenvolve o quadro de anemia não só pelo fato de produzirem células maiores que o normal, mas também porque devido a esse problema ela acaba produzindo menos células do que deveria, uma vez que algumas delas apresentam o DNA tão incorreto que acabam sofrendo morte celular na própria medula e também porque as células precursoras gigantes não realizam o número de multiplicações necessárias antes de ficarem maduras e se transformarem em eritrócitos antes de irem para a circulação sanguínea.
Como já foi dito anteriormente, em alguns casos as células precursoras de granulócitos também podem sofrer essa alteração e, quando o caso é bastante grave, a linhagem de plaquetas também é afetada, mas não na mesma proporção que as demais. Sendo assim, dependendo do caso a pessoa pode apresentar a chamada pancitopenia, que é caracterizada por um baixo número de todas as linhagens de células sanguíneas, apresentando, portanto, anemia, trombocitopenia e granulocitopenia.
Embora possa haver vários graus de anemia megaloblástica e duas causas diferentes para que ela se desenvolva, as características morfológicas são comuns a todas. Os megaloblastos se encontram maiores que os projenitores normais de eritrócitos dentro de uma medula óssea chamada hipercelular, com um grande número de células precursoras gigantes. A cromatina dessas células se encontra com um aspecto de imaturidade, caracterizada por um aspecto delgado, reticular e basofílico. Com a ocorrência da diferenciação essas células começam a ter hemoglobina, mas ainda assim a cromatina não sofre agregação, como deveria ocorrer caso fossem normais.
Os núcleos dos megacariócitos, que vão formar plaquetas, também se encontram de forma bizarra e anormal, multinucleados. Devido ao aumento de tamanho das células precursoras granulocíticas, haverá também metamielócitos maiores que o normal.
Antes mesmo de o quadro de anemia se instalar no paciente surgem no sangue neutrófilos hipersegmentados, isto é, com cinco ou mais lóbulos, além de eritrócitos ovais e grandes, bem como algumas plaquetas dismorfes e grandes. Há ainda casos em que ocorrem manifestações gastrointestinais e algumas outras alterações de morfologia em outros sistemas que antecedem a clínica da anemia.
A anemia megaloblástica causada por deficiência de vitamina B12 (cobalamina) também é conhecida como anemia perniciosa e a deficiência dessa vitamina também pode causar alteração em nervos periféricos e da medula espinal do tipo demielinizante. A absorção da cobalamina inclui diversos aspectos intrínsecos, o que contribui para o entendimento da ocorrência dessa doença, uma vez que não se resume em apenas consumir a vitamina. Após ser liberada pela digestão dos alimentos a cobalamina se liga a uma proteína salivar chamada haptocorrina e juntas formam um complexo que se dirigem até a porção duodenal do intestino, onde serão processadas por enzimas provenientes do pâncreas. Em seguida, a vitamina B12 se solta da haptocorrina e se liga ao chamado fator intrínseco, que é um fator secretado na porção do estômago a partir das chamadas células parietais da mucosa. Esse segundo complexo formado pelo fator intrínseco e pela vitamina B12 atravessam a parte intestinal do íleo e se ligam a um receptor do fator intrínseco, a cubulina. É essa ligação que permite a entrada a vitamina B12 para as células intestinais, os enterócitos. Após entrar a cobalamina é transferida para transportadores plasmáticos que vão leva-la para o fígado e também para outras células em todo o corpo.
Sendo assim, uma série de fatores podem interferir para a má absorção ou pela não absorção da cobalamina. A má absorção é o principal fator, pois essa vitamina é abundante em vários alimentos, como produtos derivados do leite, ovos, além de ser uma vitamina resistente aos modos de preparo dos alimentos, como a fervura e o cozimento. Além disso, seu estoque no corpo é de longo prazo, uma vez que geralmente uma pessoa apresenta reservas de cobalamina para cerca de cinco a até vinte anos, com quantidade suficiente para suprir as necessidades do corpo por todo esse período.
Essa má absorção envolve a questão da produção do fator intrínseco. Com relação a isso há uma possível resposta autoimune às células produtoras do fator intrínseco, as células parietais. Dessa maneira, a mucosa do estômago sofre uma atrofia. Foram detectados três tipos de autoanticorpos que interferem na absorção da cobalamina: anticorpos canaliculares parietais, que são específicos das células parietais da mucosa gástrica, os anticorpos neutralizantes, que acabam impedindo a formação do complexo vitamina B12 e fator intrínseco e os anticorpos contra esse mesmo complexo, que impede sua ligação com a cubulina, para que então a vitamina B12 consiga entrar nos enterócitos.
O interessante é que a anemia perniciosa geralmente ocorre junto a outras doenças do tipo autoimune como, por exemplo, a tireoidite de Hashimoto, diabetes mellitus tipo I e doença de Addison. Isso sustenta a etiologia autoimune de anemia megaloblástica por deficiência de vitamina B12.
Uma situação comum de deficiência dessa vitamina é após a realização de gastrectomias ou em ressecções da porção ileal do intestino, uma vez que nesses casos a produção de fator intrínseco estaria prejudicada, bem como há a perda dos transportadores do complexo formado pela vitamina e pelo fator intrínseco, respectivamente. A atrofia natural de mucosa e a diminuição de produção de ácido gástrico pode ocorrer na população idosa, o que também interfere diretamente na absorção da vitamina B12 nesses pacientes.
Como a vitamina B12 é necessária para a reutilização do foltato em sua forma essencial para a síntese de DNA, o tetraidrofolato, a administração de folato no caso de uma anemia por deficiência de vitamina B12 pode melhorar esse quadro, uma vez que o defeito metabólico que causa a anemia se correlaciona com o metabolismo do folato. Apesar disso a administração do folato no lugar da cobalamina não impede a piora das alterações neurológicas que podem ocorrer a partir da deficiência de vitamina B12, que inclusive podem ocorrer antes mesmo do desenvolvimento de uma anemia clinicamente diagnosticável.
Quando instalada a anemia perniciosa cursa como qualquer outra, com palidez, fadiga, cansaço e até mesmo dispneia e falência miocárdica congestiva, nos casos mais graves, mas, no geral, o quadro clínico de deficiência de vitamina B12 é bastante inespecífico. Pode haver alterações gastrointestinais, icterícia leve, devido à destruição das células precursoras de eritrócitos, além das possíveis alterações neurológicas, que geralmente se iniciam com formigamento de extremidades, alterações de sensório com relação à posição das mãos com relação aos pés e alterações de marcha. Essas alterações não costumam desparecer com a reposição da vitamina B12 via parenteral.
Já com relação a anemia megaloblástica por deficiência de folato é mais comum em pessoas que se alimentam muito mal e geralmente está relacionado à populações de extrema baixa renda ou em pessoas que apresentam aumento de suas necessidades metabólicas, como gestantes e pacientes com anemias do tipo hemolítica, por exemplo, isso porque o folato é encontrado em quase todos os alimentos, embora não seja resistente como a cobalamina, uma vez que é destruído em cerca de dez a quinze minutos de cozimento.
A absorção do folato ocorre na porção do terço superior do intestino delgado. Sendo assim, essa absorção pode ser afetada no caso de doenças que acometem esse segmento do intestino, como o espru tropical e a doença celíaca, por exemplo. Uma vez dentro das células, o folato é metabolizado em seu derivado, o tetraidrofolato, que é quem atua como receptor e doador de bases nitrogenadas que serão utilizadas para a síntese de DNA celular. As bases nitrogenadas que dependem do tetraidrofolato são timinas e purinas e sua deficiência é o que causa os defeitos já mencionados no DNA, desenvolvendo a anemia megaloblástica.
A anemia por deficiência de folato tem início de quadro clínico insidioso e está associado a fraqueza e fadiga, além de cansaço fácil. Os sintomas iniciais são bastante inespecíficos e o quadro clínico pode ser complicado porque juntamente com a deficiência de folato pode haver falta de outras vitaminas, o que enriquece os sintomas, podendo dificultar o diagnóstico. Em alcoólatras isso é bastante comum. O que difere da anemia por carência de cobalamina é a ausência de manifestações neurológicas.
É importante diferenciar ambas a partir de exames que mensuram os níveis de cada uma no soro e nos eritrócitos.